Os museus são, não os únicos, mas um dos possíveis lugares de memória e, assim sendo, vale refletir sobre os impactos de como essa memória é construída, cultivada e compartilhada. A partir da visita realizada ao Museu da Loucura em Barbacena (MG) proponho algumas reflexões acerca da memória sensível a qual o museu representa, essa que diz respeito a traumas vivenciados por um grupo da sociedade e que impactam pessoas diferentes, de formas diferentes.
Existe apenas uma forma de comunicar o sensível? Existe jeito errado? As percepções de uma visita realizada com olhos museológicos não busca essas respostas mas sim reflexões que permeiam a teoria e possibilitam a cada estudante pensar em adaptações, exemplos positivos e nas percepções de público e comunicação. Ao entrar no Museu da Loucura recebemos um forte impacto. Mas, o que vem depois do impacto?
No artigo “Incômodo e assustador”: visitação e experiência no Museu da Loucura de Barbacena - MG (Brasil)” os autores Pinheiro e Chemim buscam analisar as “experiências de visitação no Museu da Loucura de Barbacena segundo relatos e fotografias fotografias compartilhados nos sites Google Local Guides e TripAdvisor” (2022, p. 02). Segundo os autores, a maioria dos comentários nesses sites eram de público local, ou seja, moradores de Barbacena e cidades próximas. É recomendável a leitura do artigo na íntegra, destaco aqui algumas análises dos comentários:
No âmbito dos comentários que indicavam um choque de realidade, os visitantes afirmam que conhecer a verdade é como um “soco no estômago” (Google Local Guides, nº 119) que auxilia no desejo de efetivar mudanças: “Devemos nos chocar com a realidade para colocar seguirmos produzir mudanças. [...] É incômodo e assustador. Repensamos nossa vida” (Google Local Guides, nº 86). Isto indica que o desenvolvimento de sensações negativas nos visitantes não induz necessariamente a uma avaliação negativa da experiência, mas sim, contribui para o desdobramento da transformação pessoal individual ao final da experiência. (PINHEIRO, CHEMIM. 2002, p. 12)
E ainda,
A temporalidade no Museu da Loucura é representada em passagens a este estilo: “Foi uma experiência muito forte, você se sente lá na época em que o lugar estava ativo” (Google Local Guides, nº 69) e “[...] Foi como um mergulho ao passado não tão distante e um reconhecimento de como a humanidade é frágil” (Tripadvisor, nº 48). A capacidade de evocar o passado parte, em sua maioria, da exposição de fotografias e objetos do Hospital Colônia. Isto ocorre, pois, estes componentes solidificam as condições da época no imaginário do visitante, conectam a história com o presente e induzem a pensar nas ações do futuro. (PINHEIRO, CHEMIM, 2002, p.13)
Os comentários de forma geral, comprovam que o museu causa forte impacto aos visitantes. No entanto, quanto desse impacto é sensível à memória das pessoas que foram vítimas do holocausto brasileiro? Pessoalmente, a sensação que fica é a da de que faltam histórias. A falta da individualidade. Quem são as pessoas que estiveram ali? Sabemos que eram enviadas para reclusão as pessoas indesejadas pela sociedade naquele período, incluindo pessoas em situação de rua, mulheres com gravidez fora do casamento, mulheres abandonadas pelos maridos ou pelos pais, crianças, homossexuais, meninas que sofreram abuso sexual, entre tantas outras. Mas, quem são essas pessoas? Qual a sua história? O que podemos fazer para que, ao “voltar ao passado” do holocausto brasileiro a individualidade dessas pessoas não seja mais uma vez negligenciada? E qual a perspectivas de futuro, qual a sementinha da reflexão pode ser plantada pela conscientização, para que essas pessoas, ainda hoje marginalizadas, não continuem sendo?
REFERÊNCIAS
PINHEIRO, Anne Louise; CHEMIM, Marcelo. Incômodo e assustador”: visitação e experiência no Museu da Loucura de Barbacena - MG (Brasil). Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo. Universidade Federal do Paraná (UFPR). Curitiba, PR, Brasil, 2022.
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