a tradição das visitas técnicas

No inverno de julho de 1945, quando as moças e senhoras costumavam usar chapéus em roupas de passeio e os homens trajavam ternos à rua, a turma do Curso de Museus do Museu Histórico Nacional/RJ excursionava para a cidade de Ouro Preto em Minas Gerais. O grupo de 19 pessoas veio de trem numa viagem que durou 16 horas. Durante a permanência de uma semana visitaram também as cidades de Mariana, Congonhas do Campo e o então arraial de Ouro Branco.

Passados 68 anos, o Curso de Museologia da UFOP mantém a tradição das visitas técnicas iniciada pelo Curso de Museus. Todo semestre o DEMUL se reúne para discutir e aprovar os roteiros de viagens das disciplinas que possuem visitas previstas em suas ementas. Em geral, os estudantes organizam a hospedagem, na busca de conforto, higiene, bom preço e localização. Os professores, claro, responsabilizam-se pela elaboração dos roteiros detalhados, agendamentos, relatórios posteriores, avaliações e ainda por todo o aspecto operacional de deslocamento.

Em meio à transitoriedade do mundo contemporâneo as visitas técnicas permanecem uma boa tradição que nos orgulhamos em manter devido à sua importância como recurso pedagógico.

Este blog cumpre, pois o objetivo final de avaliar os estudantes em suas visitas aos museus. Suas postagens são registros, narrativas e leituras da experiência vivida, um diário coletivo, dinâmico, crítico, quiçá, divertido.

Tenham todos uma boa leitura e uma boa viagem!

Prof.ª Ana Audebert


segunda-feira, 19 de novembro de 2018

MUQUIFU, lugar de histórias e pertencimento...





Andreia Miranda
Nayara Fernandes
Sarha Hottes

“Temos como vocação garantir o reconhecimento e a preservação dos patrimônios socioculturais das favelas, os verdadeiros quilombos urbanos do Brasil. Lugares não apenas de sofrimento e de privações, mas de memória coletiva digna de ser cuidada.” 

O Muquifu – Museu dos Quilombos e Favelas Urbanos surgiu em 2012, em Belo Horizonte, no Aglomerado Santa Lúcia. O Museu surgiu a partir do risco de expulsão dos favelados dos centros urbanos, com o intuito de ser resistência e meio transformador, além de querer reconhecer e preservar o patrimônio, das histórias, das memórias e dos bens culturais dos moradores dos Quilombos Urbanos e Favelas de Belo Horizonte. Em 2014, o Museu foi instalado na capela da Vila Estrela.
O museu tido como de território ressalta a importância e valor que as memórias individuais e coletivas têm, é lugar de memória e representatividade, que reúne como acervo, fotografias, objetos, imagens de festas, danças, tradições e histórias que representam a vida cotidiana dos moradores, sendo que as pessoas da comunidade são agentes contadores de histórias, uma vez que o acervo do museu, em sua maioria, foi doado por eles próprios, sendo assim, são eles que escolhem, a forma como serão representados, os objetos e a forma que serão expostos para contar sua história.
O museu, por meio de seus objetos, sujeitos, histórias e memórias, implica no visitante uma ressonância muito forte. Segundo o autor José Reginaldo Gonçalves, o objeto é dotado de ressonância pois possui valor simbólico e afetivo, sendo assim capaz de evocar nas pessoas sentidos e significados. E, é por meio dessa ressonância, que o visitante do museu passa por diversas experiências e sentimentos, experiências essas pelas quais passamos ao visitar o museu, em especial quando tivemos contato com a instalação denominada “Domésticas, da escravidão à extinção” que reproduz um quartinho de empregada, com móveis que transparecem extrema simplicidade e que representam a realidade de muitas mulheres que para sustentar suas famílias precisam deixar seus lares.



Foto 1: Quartinho de Empregada. Fonte: Nayara Fernandes (2018)

O quartinho de empregada desperta uma série de sentimentos e sensações, principalmente nas pessoas que possuem um vínculo afetivo com essa história, com essa realidade de lutas e anseios, seja pelo fato de se reconhecer no espaço ou por ele nos evocar a lembrança de alguém.

Foto 2: Quartinho de Empregada. Fonte: Nayara Fernandes (2018)

Um dos elementos mais relevantes encontrados na instalação são os depoimentos deixados nas paredes do quarto, que trazem memórias, emociona quem os lê, pois são relatos a uma realidade que na maioria das vezes é solitária e árdua, onde as pessoas que exercem essa profissão, geralmente, abdicam do convívio com a própria família, da sua cidade, para ganhar o sustento e ajudar os familiares.
O vínculo estabelecido com a exposição foi tão forte, que uma aluna do curso se emocionou profundamente ao reconhecer a história de sua mãe naquele lugar. Já idosa, a mãe da aluna que durante toda vida trabalhou como empregada doméstica para sustento da família e ainda exerce a profissão para ajudar a mantê-la em outra cidade para que ela possa fazer faculdade em uma instituição federal, e dessa forma, realizar o sonho de ver a filha se formando.

“A vida inteira minha mãe trabalhou como doméstica e hoje em dia estou na universidade graças aos sacrifícios que ela e meu pai fizeram”

Visitar o Muquifu é uma experiência emocionante, pois os relatos, as histórias, os objetos e a museografia característica do museu constroem um lugar de pertencimento e reconhecimento, através de uma narrativa que retrata a vida, as alegrias e as dificuldades enfrentadas pela comunidade, de forma a imortalizar seus moradores e valorizar a riqueza cultural pertencente ao local.



Referência
GONÇALVES, José Reginaldo; BITAR, Nina Pinheiro & GUIMARÃES, Roberta Sampaio. 2013. A alma das coisas: patrimônios, materialidade e ressonância. Rio de Janeiro: Mauad: FAPERJ. 296 pp.

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