a tradição das visitas técnicas

No inverno de julho de 1945, quando as moças e senhoras costumavam usar chapéus em roupas de passeio e os homens trajavam ternos à rua, a turma do Curso de Museus do Museu Histórico Nacional/RJ excursionava para a cidade de Ouro Preto em Minas Gerais. O grupo de 19 pessoas veio de trem numa viagem que durou 16 horas. Durante a permanência de uma semana visitaram também as cidades de Mariana, Congonhas do Campo e o então arraial de Ouro Branco.

Passados 68 anos, o Curso de Museologia da UFOP mantém a tradição das visitas técnicas iniciada pelo Curso de Museus. Todo semestre o DEMUL se reúne para discutir e aprovar os roteiros de viagens das disciplinas que possuem visitas previstas em suas ementas. Em geral, os estudantes organizam a hospedagem, na busca de conforto, higiene, bom preço e localização. Os professores, claro, responsabilizam-se pela elaboração dos roteiros detalhados, agendamentos, relatórios posteriores, avaliações e ainda por todo o aspecto operacional de deslocamento.

Em meio à transitoriedade do mundo contemporâneo as visitas técnicas permanecem uma boa tradição que nos orgulhamos em manter devido à sua importância como recurso pedagógico.

Este blog cumpre, pois o objetivo final de avaliar os estudantes em suas visitas aos museus. Suas postagens são registros, narrativas e leituras da experiência vivida, um diário coletivo, dinâmico, crítico, quiçá, divertido.

Tenham todos uma boa leitura e uma boa viagem!

Prof.ª Ana Audebert


segunda-feira, 25 de novembro de 2019


Visita técnica ao Museu da Loucura em Barbacena
O Museu da Loucura foi inaugurado em 16 de agosto de 1996, através de uma parceria entre a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) e a Fundação Municipal de Cultura de Barbacena (Fundac). É uma importante construção arquitetônica considerada símbolo do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena (CHPB. Tem como objetivo principal resgatar a história do primeiro hospital psiquiátrico de Minas Gerais, o lendário Hospital Colônia de Barbacena. O Museu da Loucura serve de elo entre a instituição e a sociedade, e tem a expectativa de proporcionar a quebra do estigma contra o portador de sofrimento mental, despertando reflexões sobre as fronteiras entre a loucura e a razão.
Rico de informação, porem pequeno em seu acervo o Museu da loucura , situa-se no interior do torreão dos pátios internos do Hospital Psiquiátrico de Barbacena – MG. Logo o que impressiona é a arquitetura alemã, uma escadaria em caracol de acesso à parte superior, a construção remete os primórdios do século XIX.
No cimo do torreão a fotografia de uma interna sob grades, nua, expressa desolação, desespero e indignação, que os olhos, curiosos, buscam no desfiladeiro das escadas se depara com a cena. Causa um certo embaralhamento, vertigem e confusão, ver tal imagem numa ascensão espiralada.
A denúncia dos horrores ali cometidos veio ao conhecimento dos brasileiro e do mundo graças ao jornalista e fotógrafo Luis Alfredo, da Revista o Cruzeiro, que a pedido de Magalhães Pinto,  gravou áudio-visual, capturou imagens em preto e branco, titulou sua matéria de Sucursal do Inferno.
O acervo do museu é composto por textos, fotografias, vídeos, documentos, equipamentos, objetos e instrumentação cirúrgica que relatam a história do tratamento ao portador de sofrimento mental. O relato oral das pessoas que presenciaram os últimos tempos de horror são de muita emoção e indignação. Corpos dos indigentes eram comercializados e a super lotação era devido ao alto valor sobre cada indivíduo internado. 
A Sala de audiovisual induz o visitante a ouvir, em particular, as vozes de cada paciente a relatar suas angustias, desejos, como que um atendimento em confissão individual, pois ao adentrar à sala os sons se misturam. O sentimento que se tem é de muita dor e vontade de fugir.
Lembro o teórico Paul Ricoeur que diz que é preciso lembrar para esquecer. Em algum lugar da psique está a lembrança, mas para lembrar devemos esquecer. A memória do trauma deve ser lembrada pois é muito fácil de ser esquecida, pelo fato de, realmente e culturalmente, tentar ser apagada por remeter lembranças, triste, dolorosa, vergonhosa e repugnante. O museu da Loucura é para fazer lembrar o porquê esquecer e lembrar.  Esquecer faz parte da lembrança e se desenvolvem numa dialética complexa e dinâmica. 
O que se passou no Museu da Loucura jamais será esquecido, pois traz em sua museografia memórias de preconceitos, de uma sociedade patriarcal, que ainda vive resquícios do cientificismo, do positivismo, somados aos governos ditatoriais e autoritários.

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